Pela Janela de Casa - Parte 01




E se o seu vizinho da frente fosse aquele cara legal, com um cachorro legal, mas tivesse como amigo alguém que não é tão "legal" assim? E se em seu momento de isolamento social, você descobrisse que pode sempre se aproximar mais das pessoas que ama, como sua mãe ou até aquele rolo que nunca deixou desenrolar? Se contar sua história e fazer grandes descobertas de si mesmo fosse apenas tudo que lhe restasse?

Parece uma salada de frutas? Misture todos esses sabores e você terá a primeira parte do projeto "Pela Janela de Casa", um encontro de autores nacionais que prepararam contos sobre momentos, situações e epifanias que estamos vivendo e presenciando durante o momento de isolamento social que vem sendo aplicado no mundo. Afinal, a COVID-19 não é um problema só do Brasil, e sim do mundo.

Raquel Segal, Bruno Fontes e Matheus Rocha abrem com suas histórias respectivas, 'Pela Janela', 'Dono do Tempo' e 'O Cuidador de Pássaros'. Veja abaixo um pouquinho do que encontra em cada uma delas, seguindo minha ordem de leitura.

Pela Janela - Raquel Segal: Tudo começa como um romance e a autora nos leva bem para o centro disso. Duas pessoas que em circunstâncias normais jamais se encontrariam, mas graças ao isolamento social, acabam trocando olhares e mensagens em um caderno, como cartaz a moda antiga, pela janela de suas casas. Mas, o que Marcos e Rebeca jamais esperaram era que essa história ganharia outro tom, um pouco mais sombrio... E que isso envolveria um casal que parecia ser perfeito.

A autora nos leva para uma trama de medo e realidade e descobrimos que nem sempre o que está diante de nós é real e ela faz uma denúncia de algo que vemos acontecer em muitos lares nesse momento: o abuso doméstico. São poucas páginas que soam como um alerta, porque nem sempre vemos a verdade por tentar a maquiar com pequenas mentiras e esse conto é como um aviso de que podemos ser a diferença para salvar alguém, sim.

É, e quer saber? Não é falta de álcool em gel ou papel higiênico que vai piorar tudo. E sim a falta de empatia e o tanto de gente egoísta.

Dono do Tempo - Bruno Fontes: Existem aqueles momentos que nada faz sentido, que mergulhar em nossas tarefas é tudo que nos resta e que nem mesmo tempo para aqueles que amamos está disponível. Seja bem vindo ao mundo de um jovem que gosta de livros ao ponto de decorar alguns trechos, gosta de música e de um bom café quente. Em sua história vemos um pouco do que todos somos dentro de nós mesmos, presos nos nossos afazeres e sem muito tempo para deixar momentos como uma ligação nos desprender da realidade. Nos tornamos pequenos donos do tempo e não deixamos ele escapar para nada além do planejado, exceto que não existem mais planos reais, seu horário de trabalho em casa sempre é extrapolado, afinal, você está em casa mesmo...

Bruno nos mostra com seu texto que podemos ser donos do nosso tempo e o usar para deixar alguém um pouquinho mais feliz, seja vendo um filme ao dar play ao mesmo tempo com amigos ou aquele crush, ou compartilhando uma música em uma ligação, falando com quem amamos e damos valor, desprendendo um tiquinho de nós para estender ao outro.

O mundo é maior que um apartamento. O mundo é um barulho com cheiro, gestos e defeitos. É normal sentir-se solitário quando a vida o obriga, e tudo bem, por isso a gente liga e diz que ama. Por isso a gente sente tudo e um pouco mais do que deveria. Se a gente não divide o peso, pode ser difícil de carregar.

O Cuidador de Pássaros - Matheus Rocha: Aqui conhecemos um jovem que quer ser tudo, mas não tem tanta certeza das coisas. Matheus Santos, 23 anos, de Minas Gerais e atualmente estudante de Psicologia na USP, - ufa, ele provavelmente ficaria orgulhoso da apresentação, apesar de ser melhor fazendo isso, acredite - é aquele personagem cheio de vida e que nos leva a descobrir o quanto dele existe dentro de nós. Um romântico nato, que deixa seu coração aberto em busca do amor, mas que muitas vezes sente que o amor não busca tanto ele assim.

O autor Matheus fez com que lágrimas saíssem dos meus olhos com a reviravolta do final, porque os apaixonados de plantão bem sabem o quanto dói doar seu coração à alguém e receber ele em frangalhos. Mas, ainda mais, é aquele calorzinho de felicidade quando temos o amor recebido de volta com todo carinho e afeto, com um cuidado ímpar e principalmente, quando estamos mais vulneráveis. Nas poucas páginas dessa história recebemos uma lição linda, de como sem querer deixamos passar o principal ato de amor que podemos dar e receber, que é o amor por nós mesmos... Mesmo quando se é um namoradeiro de plantão.

Eu nunca soube muito bem o que queria, talvez por querer muito tudo. Ou um pouco de cada coisa. Eu sempre quis o mundo. Mas acho que o mundo não me quis tanto assim...

Essa é a primeira parte e logo mais teremos uma segunda leva de contos de autores nacionais sobre vida, paixões, situações e sentimentos que acontecem por todo o mundo dentro de quartos, casas e apartamentos nesse período de isolamento social. E como o final de todos os contos, vamos deixar aqui também os contatos do CVV (Centro de Valorização a Vida). Se você se você está passando por momentos difíceis, não deixe de pedir ajuda especializada, seja um psiquiatra, psicólogo ou psicanalista. O CVV também oferece auxilio emocional, eles atentem via internet no cvv.org.br ou telefone pelo 188,  todos os atendimentos são sigilosos, gratuitos e o serviço funciona 24h por dia.

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