O Segredo de Ahk-Manethon - Uma antiga história com um novo olhar

Formato:Livro
Editora: Avec
Autor: Hélio Do Soveral
Ano: Original de 1941 Reedição em 2018 organizada por Leonardo Nahoum
Páginas: 288 páginas.

Sinopse: Célio encontra a mãe chorando na cozinha e logo descobre a razão: o navio Chesterton, em que sua irmã Iracema viajava, havia naufragado nos Mares do Sul. Rapidamente, o rapaz convoca os amigos Roberto, Condor, Horácio, Tião e Afonso e organiza a Cruzada da Salvação. A operação-resgate que se segue leva a turma de crianças cariocas a uma divertidíssima aventura onde não faltam monstros marinhos, múmias, índios enfurecidos, vulcões, tesouros, lendas egípcias e, claro, o Segredo de Ahk-Manethon.

Olá amigx da internet, mais uma vez teu miasma de plantão favorito, Thiago, vem por meio deste blog para opinar e discorrer a respeito de uma obra, no caso a reedição da publicação de 1941 que sai em capítulos pela revista Mirim em comemoração do centenário do autor Hélio do Soveral.

O Segredo de Ahk-Manethon é definitivamente uma aventura épica focado no público infanto juvenil, não só pela narrativa despojada e aventuresca como também pelas personagens em sua maioria serem adolescentes que atendem um chamado pela aventura. Um molde interessante que se replicou ao longo dos anos na literatura infanto-juvenil Brasileira, como vemos em A turma do gordo de João Carlos Marinho Silva ou até mesmo na coleção dos Karas de Pedro Bandeira, ambas póstumas a obra de Hélio e com esse denominador comum de um grupo de adolescentes enfrentando uma aventura misteriosa e vilões de todos os tipos.

Até então a leitura se apresenta como uma espécie de precursor da literatura infanto juvenil brasileira, porém não se pode negar que o teor da leitura necessita de um distanciamento histórico para ser absorvido.

Diferente do que a Globo fez com as Obras de Lobato, adequando seu texto e tirando as citações de conotações racistas para assim ter uma obra de leitura mais segura para nossas gerações presentes, a AVEC escolheu manter o texto original com o mínimo de alterações possíveis, então entendam que o contexto histórico onde a obra se passa e o pensamento do próprio autor é de caráter racista e xenofóbico muitas vezes, mas por outro lado a obra nos dá a oportunidade de encarar certas questões em uma perspectiva atual, assim permitindo aos leitores mais experientes terem a chance de filtrar algumas passagens do livro e comparativamente entenderem que o contexto atual é outro.

O desenvolvimento de personagens é superficial de certo modo, mas isso é o esperado de um romance aventuresco adolescente. Um atrativo é que, apesar do grupo ter sua carga de lutas travadas, alguns conflitos foram resolvidos com perspicácia e trabalho em equipe.
A aventura não tarda muito a começar, mas admito que algumas passagens se estenderam por demasiado em diálogos que julguei desinteressantes. Ainda assim o desenvolvimento da trama como um todo e a forma que são apresentados alguns personagens característicos, como o intrépido lobo do Mar Capitão Teodoro que muitas vezes se mostrou demasiadamente corajoso e com um sério défice de ponderação, muitas vezes se posicionando de forma agressiva e bradando frases como “Para com os diabos com isso, não recuaremos diante de nada, lutaremos até o final!!”.
Talvez a estereotipação e o exagero de determinadas personagens seja um recurso do autor para manter a leitura simples e empolgante, afinal seu público alvo da época convivia com esta estereotipação diariamente e provavelmente eles se identificavam com alguns personagens e pensamentos colocados no texto.

Não posso negar que o molde básico de Célio, o protagonista da obra, é um molde embasado na típica saga do herói, um chamado pela aventura seguido de jornada, dificuldades, superações e por fim recompensas.
Célio demonstra certo amadurecimento na obra, mas não se nega que desde as primeiras páginas ele já foi construído como um herói, muitas vezes se forçando a mostrar uma maturidade a qual não tinha de fato. Porém, a liderança atribuída a ele pelo protagonismo acaba sendo justificada com as ações ao longo das desavenças enfrentadas pela trupe. Talvez se houvesse intenção do autor em tornar os personagens um pouco mais esféricos, ele aflorasse como um líder justo e gentil, mas por fim a impressão que tenho é de que nosso herói é um garoto peralta com muita sorte. Não que isso seja negativo, não perde-se a graça da leitura com essa impressão, apenas alerto que o desenvolvimento das personagens não é bem o foco, o foco real está na resolução do mistério que vai sendo apresentado ao longo da obra.

Por fim, a leitura me remeteu a um passado nem tão longínquo de nosso Brasil, as personalidades, pensamentos, e até comportamentos a serem observados durante o livro são uma oportunidade de aprendizado por contextualização.
É inegável que Hélio do Soveral é um marco para a literatura infanto-juvenil Brasileira, e acho que a Avec se posiciona muito bem em suas notas ao tipo de olhar que ela espera dos leitores para esse livro.
Entendo a decisão da editora de não alterar o texto original e admito que ler as notas me fez refletir melhor sobre a abordagem de minha leitura para com o livro.

Ainda assim, é uma obra que merece ser discutida e analisada.
Como falei anteriormente, alguns pontos dessa obra se refletem na literatura presente, então é natural que conhecer as raízes ajude até mesmo na compreensão do que se construiu em nossos tempos contemporâneos.
Talvez se não fosse o distanciamento histórico eu teria um olhar mais jovial sobre a obra. Porém, ciente de nossos contextos, acho que o livro abre discussões em diversos frontes mais profundos e merece uma atenção de um público refinado e experiente, não consigo mais vê-lo apenas como uma
leitura infanto-juvenil, mas sim como uma proposta de aprendizado.

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